O Senet é um dos jogos de tabuleiro mais antigos já registrado. As descobertas junto à tumba de importantes reis indicam que ele pode ter sido um importante jogo do império egípcio.
Encontrado por meio de escavações arqueológicas, testes dataram o jogo entre 3500 A.E.C. e 3100 A.E.C, embora existam alguns hieróglifos de tabuleiro Senet da Primeira Dinastia (3100 A.E.C.) indicando que o jogo pode ser mais antigo. Um dos principais registros, é a pintura da Rainha Nefertari na parede de sua tumba jogando Senet, além de quatro kits terem sidos encontrados junto ao faraó Tutankamon pelo arqueólogo Howard Carter.
Indo além da simples diversão, o Senet possuía uma representação religiosa, a etimologia do nome do jogo significa “passagem”. As regras e sentido do jogo nunca foram descobertas claramente, embora estudos apontem que a jogabilidade representa a passagem dos povos egípcios para a eternidade após a morte, enfrentando possíveis perigos e forças do mal que pudessem impedir a chegada.
No início, o Senet não era um jogo religioso, e sim um simples passatempo. Mas, conforme os egípcios passaram a crer na vida após a morte, isso acabou se sobrepondo ao jogo e mudando seu significado. Essa mudança para uma simulação do mundo dos mortos ocorreu no final da Décima Oitava Dinastia, em 1293 A.E.C.. Durante este período, as pinturas nas tumbas de pessoas jogando Senet tiveram uma mudança surpreendente: o jogo não era mais incluído entre as cenas da vida diária, eles agora apareciam em um contexto religioso, de cenas ritualísticas. A partir daí, as pinturas passaram a mostrar o jogador como uma pessoa falecida jogando contra um adversário invisível, o que possivelmente seja a sua própria alma, o que pode explicar porque tantas pinturas do Novo Reino mostram jogadores sem oponentes.
Peças
O jogo era composto por um tabuleiro dividido em 30 casas, dispostas em três fileiras de dez quadrados cada. Seis dessas casas são casas especiais, que indicam movimentos a serem feitos pelos jogadores. Inicialmente, cada jogador recebe cinco peças, em formatos de carretel ou obelisco, uma mudança que aconteceu durante a Décima Oitava Dinastia (1570-1293 A.E.C.), foi a de que cada jogador passou a usar cinco peças em vez de sete e o jogo passou a ser construído em uma caixa de madeira independente, com uma gaveta para abrigar as peças e os palitos. Esses quatro palitos funcionam como uma espécie de dado, em que um lado é de cor clara e o outro escura, definindo assim a movimentação do jogo.
Tabuleiro
Várias casa do tabuleiro possuem significados religiosos, e seis delas têm interferência na jogabilidade do Senet. As principais são:
Casa 1: conhecida como a Casa de Thoth, a divindade com cabeça de íbis, é um pássaro empoleirado no topo de um estandarte. Thoth é o primeiro a embarcar porque, de acordo com a crença, é o primeiro a anunciar a chegada do falecido ao tribunal de julgamento e providenciar para que ele possa navegar em um barco através do submundo com a tripulação de Rá, deus sol criador do Universo e da humanidade.
Casa 12: descreve a constelação de Órion como uma figura em um barco com a cabeça voltada para trás. Órion era uma manifestação de Osíris, deus e governante do mundo dos mortos. A ascensão de Órion ao céu noturno foi pensada para espelhar a ascensão de Osíris ao mundo dos mortos.
Casa 15: essa é a primeira casa especial. Localizada no meio do tabuleiro, pode ser representada como um sapo, o símbolo egípcio da ressurreição. Repetir a vida era algo comum para pessoas falecidas e referia-se à continuação delas após a morte. É para esta casa que o jogador volta caso caia na casa da água. Neste momento, se houver outro peão nesta casa, este é banido para a casa de número 1.
Casa 26: conhecida como Casa da Beleza, ela é a segunda casa especial. Em duplo sentido, esse quadrado também se referia à oficina de múmias, onde um corpo era preparado para o sepultamento, rejuvenescimento e, por fim, a vida eterna. Ela é um ponto de parada obrigatório no jogo. Todas as peças devem parar nela antes de seguir para a saída do tabuleiro. Nesta casa, a peça não pode ser atacada.
Casa 27: representando as Águas do Caos, a terceira casa especial representa o barco do submundo que flutuava ao amanhecer. Os pecadores, a quem foi negado um lugar no barco, eram afogados nessas águas. Caso caia na casa da água, sua peça é movida para a casa da ressurreição (Casa 15).
Casa 28: a quarta casa especial, a Casa das Três Verdades, é representada por três pássaros. Ao cair nesta casa, você só sairá dela ao tirar o número 3 nos palitos. Nesta casa, a peça não pode ser atacada.
Casa 29: Chamada de Casa de Atum-Rá, a casa do Deus Sol (Rá) dirigindo-se ao ocaso, ela segue a mesma linha da casa anterior e também é uma casa especial. Ao cair nela, só poderá sair ao tirar o número 2 nos palitos. Nesta casa a peça também não pode ser atacada.
Casa 30: a última casa do jogo também é uma casa especial. Ela é o quadrado de Re-Horakhty, o nome do deus sol quando ele se levanta ao amanhecer. Ao cruzar esta casa com cada uma de suas peças, os jogadores vencem o Senet. A saída das peças do tabuleiro é equivalente a nada menos do que a passagem do falecido para fora do mundo dos mortos, em união com Rá. Caso caia nesta casa, você deve aguardar um turno para sua peça poder ser removida do tabuleiro. Nesta casa a peça também não pode ser atacada.
Vale lembrar que, tanto os significado das casas, quanto suas funções e a jogabilidade do Senet, nunca foram descobertas fielmente, podendo ter variações e regras que tentam se aproximar da época em que foram elaboradas, através de estudos de pesquisadores. Vários historiadores pelo mundo deduziram suas próprias regras, e assim, cada um tenta convergir para um conjunto de instruções que o tornam jogável.
Mecânica do Jogo
O objetivo do Senet é retirar todas as peças do tabuleiro antes do seu oponente, evitando ataques e fugindo das armadilhas das casas especiais. Para andar, os jogadores fazem um movimento de “S” pelo tabuleiro. Inicialmente, as peças devem ser posicionadas de forma intercalada, ou seja, um peão em obelisco seguido de um carretel. Por regra, na casa 1 deve estar localizado um peão no formato de obelisco.
Para contar quantas casas cada jogador deve andar, os quatro palitos são lançados, e as cores que estiverem viradas para cima são as que irão determinar o resultado. Se houver uma cor branca para cima, o resultado será um; se houver duas cores brancas para cima, o resultado será dois; se houver três cores brancas para cima, o resultado será três; se houver quatro cores brancas para cima, o resultado será quatro; e se houver quatro cores pretas para cima, o resultado será cinco.
O jogador que tirar o número dois primeiro inicia o jogo e deve lançar os palitos novamente para determinar o número de casas para se movimentar. Resultados de um, quatro e cinco garantem uma rodada extra para o jogador. Cada participante deve escolher uma de suas cinco peças para movimentar o número de casas indicadas pelo resultado dos palitos, desde que seja um movimento válido. Caso contrário, deve passar a sua vez.
Quando uma peça de seu adversário estiver sozinha, ela pode ser atacada, portanto se você cair na mesma casa que um adversário, você ataca a peça dele e elas trocam de lugar. Não podem haver duas peças em um mesmo espaço de tabuleiro e sempre que houverem duas ou mais peças seguidas do adversário, as mesmas não podem ser atacadas e nem ultrapassadas.
Senet era o jogo de tabuleiro mais popular do Egito e foi jogado por mais de três mil anos. Esta duração de um jogo de tabuleiro parece ser exclusiva do Egito e está conectada ao conservadorismo da cultura. Se o jogo não tivesse sido rejeitado pelo cristianismo no final do período romano, por seu simbolismo religioso pagão, poderia ter durado muito mais tempo. Pesquise as regras, escolha as que mais te agradam e aproveite para jogar o jogo dos faraós.
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[…] como nas matérias específicas sobre Senet e Mancala, neste artigo, a Gamegesis busca, além de apresentar um pouco do histórico dos […]
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