Adaptação, caixas e o online: Como as Escape Rooms se adaptaram ao cenário de pandemia?

Adaptação, caixas e o online: Como as Escape Rooms se adaptaram ao cenário de pandemia?

Do primeiro momento até as soluções diversas e os desafios do novo normal

As escape rooms virtuais tomaram o lugar das salas físicas | Foto: se7en.ws/Arquivo

As empresas de escape rooms viviam um momento de crescimento do mercado e de abertura de novas salas ao redor das cidades brasileiras, com grandes franquias concorrendo em pé de igualdade com empresas locais.  Cada uma delas, com ideias, enigmas, narrativas e estilos de jogos diferentes para diversos públicos, desde o público mais casual, como grupos de amigos, famílias e casais, ao público corporativo, com processos seletivos de novos funcionários, treinamento de equipes e divulgação de eventos, incluindo ainda o público educacional, com ensino de conteúdos escolares e divulgação de cursos técnicos e de graduação.

A BH Escape possui diversas salas, entre elas uma tematizada do lendário roubo da Taça da Copa do Mundo de 1970 | Foto: BH Escape/arquivo

Em Belo Horizonte, o cenário era de crescimento. Apesar da concorrência com as formas mais tradicionais de lazer da cidade, como bares, partidas de futebol e cinema e, mesmo com o boom de salas, apenas algumas se consolidaram e se mantiveram na cidade, contando com um público cada vez maior, demonstrando curiosidade com as novas salas, como conta Pedro Alvim, sócio da BH Escape, escape room localizada na capital mineira:

“Quando surgiu o escape [room] em 2017, surgiram até bastantes salas, teve muitas empresas, aqui em BH, eu acho que foram seis ou sete. E, depois que foi consolidando o mercado, em 2018, 2019, algumas foram fechando porque tinham pessoas que criaram só pelo lazer, então eles mesmos construíram a sala e às vezes fica um pouco pesado [o orçamento] junto do próprio serviço normal, então a gente acabou consolidando em três escapes [rooms] no ano de 2019.”

Uma das salas da Scotland Escape Room trata da investigação de um assassinato | Ilustração: Scotland Escape Room

Já no cenário do interior de São Paulo, as escape rooms começavam a crescer e se espalhar pelas grandes cidades de forma gradual.  Esse crescimento veio muito do uso do marketing e da relação criada com os clientes que voltam depois de irem pela primeira vez nas salas, pois o jogo nessas cidades é muito novo e precisa da publicidade, seja por meio da divulgação em redes sociais ou da conversa entre amigos, que divulgam as salas mesmo sem perceber e aumenta a popularidade. De acordo com Ana, da Scotland Escape Room, localizada na cidade de São Carlos:

“O mercado estava em expansão, cada vez mais empresas vinham surgindo, principalmente nas cidades dos interiores de São Paulo e outros estados do Sul. Não posso dizer que era uma expansão rápida, pois as pessoas não conhecem esse tipo de entretenimento e como o custo é alto para construir os cenários, o valor cobrado dos clientes deve ser referente. Então, como o público não conhece, a maioria dos escapes do interior lutam diariamente para trazer clientes para conhecer, apesar do valor ser menos atrativo do que outros entretenimentos da cidade (como cinema e festas). Mas a maioria dos clientes que conhecem voltam para os novos jogos. O movimento é extremamente relacionado  ao quanto a empresa investe em marketing, pois, como já foi dito, poucas pessoas do interior conhecem.”

A 60 minutos tem cinco salas e uma delas o grupo acorda depois de uma festa e precisa escapar do apartamento 71 | Imagem: 60 Minutos/arquivo

Já em São Paulo e em sua região metropolitana, com uma das maiores concentrações populacionais do mundo e com a maior do Brasil, o cenário é parecido com o de outros estados: desconhecimento das escape rooms pelo público e divulgação árdua das salas para atraírem mais gente , mesmo com muitas empresas atuando na Grande São Paulo, como conta um dos funcionários da 60 Minutos: 

“Ainda é um mercado pouco conhecido e o maior desafio continua sendo fazer as pessoas conhecerem a modalidade de entretenimento. Existiam cerca de 50 empresas até então e o movimento era satisfatório, tanto no entretenimento, quanto no corporativo.”

O mercado parecia estar em uma crescente que não parecia parar tão cedo, por mais que fosse de forma calma e constante, até que o mundo parou de repente por conta de algo que ninguém esperava e ninguém podia se preparar no primeiro momento: a pandemia de COVID-19

Fechar, adaptar e reabrir (e fechar de novo)

Comércio e atividades considerados não essenciais fecharam a porta na pandemia | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

No fim de 2019, a COVID-19 foi detectada, uma nova doença respiratória, com alta transmissibilidade e severidade. Rapidamente a Organização Mundial da Saúde a declarou como pandemia global, chegando ao Brasil no fim de fevereiro de 2020 e rapidamente se espalhando, fazendo com que algumas cidades e estados implementassem medidas restritivas, com o fechamento temporário de todos os serviços não essenciais.

Diversas empresas do setor do entretenimento como eventos e jogos, incluindo as salas de escape room, sofreram muito no primeiro momento, passaram por períodos difíceis de perda total do movimento, buscando uma trabalhosa adaptação recorrendo aos ambientes virtuais. Para muitas dessas salas, ficou inviável tentar manter toda a estrutura de funcionários, aluguel, equipamento e manutenção, obrigando-as a fechar momentaneamente ou a sair do mercado, como nos conta a 60 Minutos:

“Ficamos fechados por determinação do governo por quase 6 meses então o movimento foi a zero, de uma semana para a outra. Tentamos opções como jogos online, sem muito sucesso. A volta foi muito lenta e continua até hoje. Hoje temos aproximadamente 10% do movimento pré-pandemia.”

Outras salas, no entanto, começaram com um certo sucesso um processo de adaptação de mudança para o digital e tem conseguido se manter de forma estável, mesmo que com menos movimento e com jogos muito diferentes do momento pré-pandemia. A solução foi tentar outros caminhos, com destaque para dois: um conhecido como “lives escapes”, modelo em que um grupo de jogadores se reúne em uma videochamada para comandar um funcionário que fica dentro da sala “física” e outro conhecido como “escape boxes”, no qual uma caixa é recebida pelos jogadores, que devem resolver os enigmas que vem nessa caixa até chegar no resultado, com todos os desafios presentes apenas ali dentro, como nos conta Ana da Scotland Escape Room:

“Acabamos tendo que nos reinventar, lançamos os jogos live escape onde os jogadores controlam um personagem dentro da sala através de uma plataforma de videoconferência. Também criamos uma escape box, é basicamente um jogo de escape dentro de uma caixa, as pessoas alugam essa caixa cheia de enigmas por 24 horas para jogarem na sua própria casa.”

As videochamadas e a transição para a vida digital foi grande parte das mudanças em diversas áreas da vida | Imagem: pikisuperstar / Freepik

Já o BH Escape conseguiu fazer um modelo parecido com as Live Escapes que começaram a ser realizadas também no exterior no começo do ano, ganhando um público que também se adaptou ao digital, conseguindo manter a estrutura da sala mesmo que com menor renda.

“Estudando o que os americanos fizeram, eles fizeram essa modalidade do live escape e a gente trouxe pro Brasil. Nós somos a primeira empresa do Brasil inteiro a fazer, que é basicamente um funcionário nosso dentro da sala com uma câmera e as pessoas vão indicando o que ele tem que fazer, então o nosso funcionário é como se fosse uma marionete e as pessoas jogam o jogo em tempo real, e que tudo vai lá por meio da interação do próprio smartphone. Então, a gente chegou um pouco mais preparado do que os outros escapes, mas o que não quer dizer que isso tenha sido um cenário favorável, foi um cenário que impediu que a gente fechasse, mas não era um cenário tão próspero como era antes.” 

Caixas, virtualidade e videochamadas

Com as alternativas ao escape room, diversas situações ocorreram com as empresas do ramo, desde o sucesso e a continuidade do público fiel, à conquista e o descobrimento de novos públicos, inclusive internacionais, mas também, infelizmente, o insucesso de modelos digitais em um país que não conseguiu se adaptar de forma rápida durante a crise sanitária. Todas as adaptações que foram produzidas, desde os novos modos até a volta para as salas, que aconteceram em um pequeno período de reabertura, dispuseram de padrões rígidos de higiene, como a necessidade de máscaras pelos jogadores e equipe, a higienização das salas e grupos reduzidos e fechados para evitar qualquer contágio. 

A escape box da Scotland Escape Room tem a temática de uma caixa egípcia enigmática | Imagem: Scotland Escape Room/Arquivo

No caso da Scotland Escape Room, a adaptação foi para os dois estilos não presenciais das escape rooms, tanto com as live escapes quanto às escape boxes, precisando se adaptar à necessidade de novos equipamentos e estruturas,  como nas live escapes, e a alternativa econômica,  de menor custo, com as escape boxes por não necessitarem de cenário:

“Quando a pandemia chegou no Brasil acabamos tendo que aderir a esses novos formatos. Para o live escape, tivemos que comprar novos equipamentos (microfone, suporte e estabilizador de celular, entre outros). A escape box foi mais um projeto de jogo, nada muito diferente do que já criamos, mas sem o custo de erguer um cenário. Nossa escape box e todos seus itens são higienizados antes de serem levados e também quando retornam, várias equipes alugaram mas não teve a mesma adesão dos jogos habituais.”

Já a BH Escape mergulhou de cabeça nas Live Escapes, ampliando a sua estrutura e desbravando o modelo de salas que impulsionou a popularidade além dos limites físicos e locais, abrindo para grupos de outros países e criando um público internacional, se equiparando a padrões de salas do exterior, com mais anos de estrada e com maior investimento, gerando elogios e mantendo uma nova possibilidade de público, mesmo com a suposta futura volta das salas físicas como eram originalmente:

“Essa nova abertura fez o cenário mudar bastante, as perspectivas de abertura para um mercado que inglês ou brasileiro, que não teve tanta adesão, mas o mercado internacional de escape room, de pessoas que tem suas próprias salas, em todo canto do mundo, foi uma mudança de paradigma para pensar. Foi bem bacana porque a gente acabou jogando outros jogos de outros locais e a gente percebeu que precisava melhorar alguns aspectos do nosso jogo. A gente tem uma das nossas salas que competiu, chegou na final de um torneio internacional. Mas a gente percebeu que a qualidade do exterior é muito alta.” 

Ainda sobre as live escapes, Pedro Alvim comenta como o público internacional mudou paradigmas a respeito de como fazer as salas e como adapta-las:

As três salas da BH Escape foram adaptadas para o Live Escape, incluindo um mistério envolvendo Santos Dumont | Foto: BH Escape/Arquivo

“Essa abertura pro mercado do exterior fez a gente melhorar a nossa produção de uma forma bem legal, que a gente começa a fazer como outras casas[no exterior] estão fazendo, começando a tentar igualar, porque ficar abaixo não é bacana. Então, uma coisa positiva disso, além de atingir outras pessoas, além de ter acesso a outras culturas, foi isso, foi nossa qualidade do nosso próprio jogo, melhorar com base nessa nova competição, porque a gente agora está competindo com jogos que tem o orçamento infinitamente maior que o nosso. Então, a gente tem que ser criativo e tem que usar tudo que a gente pode.”

Ao contrário das duas salas, a 60 Minutos Escape Room não demonstrou ter sucesso quanto a adaptação ao modelo digital, sofrendo devido à pouca adesão do público com os modelos digitais. Por isso, a alternativa foi tentar voltar com os modelos físicos nos períodos de menor restrição de movimento e usando de medidas de proteção, como as máscaras, grupos fechados e de higienizantes por todo o espaço para evitar o contágio:

“Hoje pedimos para as pessoas virem jogar em grupos que já convivem normalmente, evitando contato com outras pessoas. Restringidos os horários para que os grupos não se encontrem dentro da empresa, colocamos sanitizantes e implementamos a obrigatoriedade de máscaras em todo o espaço. Continuamos entrando e saindo das fases restritivas e muitas pessoas continuam com medo de sair de casa. O movimento hoje é 10% do esperado. Sem muito horizonte para melhorar num futuro próximo.”

O mistério da volta das escape rooms

As escape boxes, apesar de existirem anteriormente a pandemia, ganhou forte popularidade devido ao isolamento social e ao fechamento das salas | Foto: originalpuzzlecompany/Arquivo

A volta da vida “normal” depende da vacinação em ampla escala e planejada e do controle do número de casos, com medidas defendidas pelas autoridades científicas e sanitárias.  Até as salas voltarem como eram originalmente, a espera será longa e terá que ser substituída por outros modos de jogo.

Esses novos modelos estão cada dia mais populares e ganharam muitos adeptos pelo mundo, com as Lives Escapes ganhando uma comunidade global que antes não existia por conta das distâncias, ou proximidades, físicas que agora estão apagadas pelas novas ferramentas digitais, ou pela situação sanitária.

As escape boxes são outro novo modo de jogar as escape rooms, sem a necessidade de um cenário montado e de sua manutenção, estimulando o pensamento “fora da caixa”, conseguindo manter a interação com os puzzles por todos do grupo, de forma simultânea, ao contrário das Live Escapes, onde a equipe “controla” apenas um personagem.

No próximo texto da série, trataremos desses novos modelos de escape rooms de forma aprofundada, desde suas origens e pesquisa e de como se adaptaram rapidamente para a situação de isolamento social. Até lá, usem máscara, fiquem em casa e game on!

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