Não é incomum as pessoas lerem “Game gênesis”. Embora haja uma leve correlação com gênesis, o termo não foi criado para apresentar o “relato da criação dos jogos”. Mas então, o que significa Gamegesis?
Gamegesis é um neologismo, advém da junção entre as palavras “game” e “diegesis”. “Game”, acredito que não seja desconhecido da maioria, significa jogo em inglês. Já a “diegesis”, é o termo em inglês para diegese, um conceito exclusivo da área da narrativa, ou narratologia, que representa a criação e existência de um universo ficcional.
Assim, Hogwarts, os bruxos e os outros elementos de Harry Potter, criado por J.K. Rowling, são partes de uma diegese que permitem que histórias como as de Harry Potter ou de Animais Fantásticos e Onde Habitam sejam criadas e contadas. A Terra Média, com suas mitologias, crenças específicas, línguas, raças, regras universais, como as magias e o Um Anel, dentre outros, são elementos da diegese que proporcionam histórias como o Hobbit e do Senhor dos Anéis, criados por J.R.R. Tolkien.
Pode-se dizer que uma diegese é o “continuum espaço-tempo” de uma narrativa. Se uma diegese está relacionada a um conjunto de narrativas, o conjunto de todas as diegeses representaria todas as narrativas possíveis. Considerar o conjunto de todas as narrativas proporciona informação para que a área seja explorada, pesquisada e que conhecimentos sejam obtidos.
A Influência da Diegese na Gamegesis
O projeto Gamegesis não se fundamenta na área de narrativa ou narratologia. O uso do termo diegese se dá por dois motivos: uma similaridade histórica, apresentada neste texto, e uma similaridade prática ou de produção, apresentada no texto complementar, seguinte a este.
O que conhecemos sobre análise, pesquisa e produção de narrativas atualmente começa a tomar forma com Vladimir Propp no chamado “Movimento Estruturalista Russo”, onde é proposto um conjunto de “funções” que comporiam as narrativas de modo a prover uma estrutura para melhor estudá-las e criá-las.
A intenção de Propp era justamente o de ajudar no desenvolvimento da área de narratologia. À época, havia um conjunto de definições para categorizar narrativas em que todas as categorizações apresentavam subjetividade ou ambiguidade. Essas categorizações funcionavam muito bem para quem as tinha definido, mas era uma complicação para a área acadêmica.
Uma proposta de categorização, ou seja, uma taxonomia, única e de comum acordo com os profissionais da área, como é com a Física, Química, Matemática ou Biologia, é importante para que a área se desenvolva adequadamente. Assim, todos pesquisam sob a mesma estrutura, usam os mesmos jargões e, tanto a produção quanto a compreensão sobre o assunto, são facilitadas.
Para que a área de narratologia chegasse à configuração que se encontra hoje, foram necessárias inúmeras pesquisas e melhorias a respeito de narrativas, as quais se beneficiaram da estrutura morfológica proposta por Propp, mas essa estrutura não passou sem mudanças. Ela foi analisada e melhorada.
Mas como a proposta de Propp se relaciona com o projeto Gamegesis? Primeiramente pela situação e em seguida pelos objetivos. Em relação à situação, jogos atualmente são elementos sem uma definição consistente, sem um mecanismo de classificação, como são os mecanismos taxonômicos da biologia, física, química ou matemática. Isso significa que o que uma pessoa entende por jogos pode não ser o mesmo entendimento de outra pessoa. E por não existir definição formal, não podemos dizer que elas estejam erradas.
Essa é exatamente a mesma situação em que se encontravam narrativas quando Vladimir Propp iniciou o trabalho de análise e categorização de contos fantásticos, culminando na “Morfologia do Conto Fantástico”, que deu início ao processo de convergência do entendimento de narrativas. Observe: narrativas, fantásticas ou não, eram produzidas, mas o processo de análise delas tinha que ser feito de forma subjetiva, o que é um trabalho bastante complexo e demorado, principalmente quando se considera a educação para a produção do objeto.
Da mesma forma, jogos também são feitos, são consumidos, tanto naquela época quanto hoje, mas a situação de compreensão sobre eles é exatamente a mesma das narrativas antes da “Morfologia do Conto Fantástico”. As pesquisas que culminaram na Gamegesis especularam sobre se o processo de desenvolvimento da análise da narrativa, desde Propp até Barthes, não poderiam contribuir em algo. E assim identificamos o termo “diegese” como sendo o universo de uma narrativa, ou como sendo o conjunto de universo da narrativa, para compor o termo da metodologia, e agora do projeto Gamegesis, o universo do jogo.
Então, como analisar jogos? Como entender jogos? Acompanhe nossos posts e podcasts que indicaremos o caminho. E, em breve, teremos também ferramentas educacionais específicas para vocês!
Ah, a atribuição do nome quanto à similaridade prática relaciona-se a características relativas a outras áreas e os processos para utilizá-las. Abordaremos essa similaridade e essas características no próximo post.
Até a próxima… e “Game On”!